O mais autoral de Takai

10/04/2014

The specified slider id does not exist.

Powered by WP Bannerize

Revista NOIZE

Por: Revista NOIZE

Fotos:

10/04/2014

Fernanda Takai não para. Ela acaba de lançar pela Deck Disc mais um disco solo, “Na Medida do Impossível”, em que mostra seu lado compositora mais do que nos álbuns anteriores.

“Na Medida do Impossível” já está à venda em diversos formatos, inclusive em vinil na cor vermelha. O disco também será lançado no Japão, país que ela mantém relações estreitas fazendo shows e distribuindo seus trabalhos e do Pato Fu por lá. Recheado de participações especiais, “Na Medida do Impossível” reúne velhos e novos amigos de Takai em canções aconchegantes e arranjos criativos. As viagens, os companheiros, a mulher, memórias, e outros pedaços da vida da compositora estão representados no disco com uma sonoridade pop que mistura diversos elementos e a doce voz de Takai.

*

Ela conversou por telefone com a gente sobre os elementos de seu novo disco e como sua vida está representada nele. O papo delicioso que a gente teve com Fernanda Takai você confere logo abaixo.

“Na Medida do Impossível” é seu álbum mais autoral. Você tinha algum receio quanto fazer composições que não fossem para o Pato Fu?

É, eu digo que eu não queria esvaziar o repertório autoral, que geralmente acaba indo pro Pato Fu. Então eu pensei em outras pessoas pra compor comigo, foi pra justamente não adotar a mesma fórmula que eu tenho pras músicas do Pato Fu, que é chamar o John e juntos a gente compõem. Aí eu me senti à vontade pra dessa forma lançar um disco que tivesse o meu lado de intérprete, que é muito importante, pegar musicas que eu ouvi e que eu quero gravar de outro jeito, e também mostrar que eu faço música e também posso fazer música com outras pessoas, algumas até completamente fora do esquadro que as pessoas poderiam pensar, né. A ideia do disco foi essa, mostrar os dois lados dessa vez, não só o meu lado intérprete, como vinha sendo a minha carreira solo.

Como foram as gravações do disco?

Eu tenho um estúdio em casa. Desde 2003, tudo o que a gente grava, o Pato Fu ou eu e minhas coisas solo, a gente grava nesse estúdio. É um estúdio que é só nosso, ele não é comercial, não dá pra alugar horário lá. Outras pessoas já gravaram nele, no caso da Zélia Duncan, da Érika Machado. Mas é mais por amizade mesmo. Só tem eu e o John no estúdio, a gente que faz tudo. Basicamente, o John faz tudo e eu faço café (risos) e canto. É um estúdio caseiro, mas é bem equipado, tem tudo o que um estúdio bom tem. Só não tem o que um grande estúdio teria tipo assim, dez dos melhores microfones, dez amplificadores, dez baterias,… Ele tem um de cada coisa necessária. Bem modesto, mas equipado com coisas boas.

Qual é a linha que amarra todas as faixas de “Na Medida do Impossível”?

Esse disco me representa como ouvinte, né. Porque todo mundo que tá aí, compositor antigo como Benito Di Paula, como Reginaldo Rossi, ou os parceiros mais recentes, a Pitty, Bonfá, Marina, e tudo mais, são pessoas que eu admiro, que apareceram na minha vida e agora a gente se encontrou. O Samuel [Rosa] também, é um cara que é da minha geração e que eu nunca tinha gravado com ele. Então são todas as pessoas que estão nessa minha vida de ouvinte e de artista e que eu tinha vontade de trabalhar com eles. A espinha dorsal do disco é a vontade de realizar esses convites. E o fato das pessoas terem aceitado só fez bem. Todo mundo que eu chamei ou as músicas que eu precisei de autorização, como a do George Michael, tudo foi cem por cento ok, eu não tive nada que eu quis colocar nesse disco que não pude. É muito difícil essas coisas acontecerem nos dias de hoje. Por isso que o disco saiu desse jeito.

O disco tem inspirações diferentes das que você têm para as músicas do Pato Fu?

Eu sou desse jeito sempre, só que no Pato Fu eu tenho mais quatro músicos e a gente vota tudo, é uma democracia artística da banda. Eu não canto diferente nesse disco do jeito que eu canto no Pato Fu, as músicas que eu gosto de ouvir não são diferentes. Só que assim, quando eu vou pro Pato Fu numa reunião que a gente vai decidir coisas, eu preciso ouvir as outras pessoas, aí o Pato Fu é resultante desses cinco artistas. Um disco solo meu, ele é meu, todas as escolhas são minhas. Desde o arranjo do disco, pra que lado ele vai, quem vai fazer a capa, quem é o cara do clipe, tudo sou eu quem indico e aprovo. Eu exerço uma posição até autoritária de fazer as escolhas sozinha, mas tô sempre acompanhada, não faço tudo sozinha, mas as escolhas são todas minhas. No Pato Fu, você me vê junto com as escolhas do John, do Ricardo, do Xande e do Lulu, somos as cabeças ali decidindo. Eu defendo as minhas ideias da mesma forma, fora e dentro do Pato Fu, só não ganho todas (risos).

Você tem duas coletâneas e um livro infantil. A primeira coletânea chama-se “Nunca Subestime uma Mulherzinha”. O “Na Medida do Impossível” também seria um jeito de mostrar a importância das mulherzinhas?

É, o título desse livro foi na tentativa de mostrar as mulheres invisíveis, né. As mulheres do cotidiano, a mãe, filha, a empregada, a colega que trabalha com você, que estuda com você. A gente às vezes fica acostumado com essas figuras. Acha que “Ah, elas não vão dar conta” ou “Ah, isso que ela faz eu também faço”. Nós, mulheres, fazemos isso em relação a outras mulheres, e os homens fazem isso muito mais, eu acho. Eu sou baixinha, pequena, mas eu faço um monte de coisa. Tem coisa que eu faço que ninguém mais faz. Mas todo mundo de longe, acha que faz. Só a falta dessas mulherzinhas é que faz um pouco as pessoas pensarem sobre isso. A música do Benito Di Paula que eu gravei fala exatamente disso. Acaba a valentia do homem quando a mulher que ele ama vai embora.

Na sua casa, têm mais discos de vozes femininas ou masculinas?

Femininas. Muito mais.

E você tem muitos discos de vinil?

Não tenho, não. Os meus vinis do tempo de adolescente eu nunca me desfiz deles, e depois que o meu pai morreu eu fiquei com os vinis dele também. Mas quando apareceu o CD, eu não fiquei loucamente caçando vinil. Eu respeito o suporte das músicas. Eu tenho, até hoje, um monte de fita-cassete, vinil, CD, uso MP3. Eu lancei o disco também em vinil, porque existe, realmente, um público que gosta mais do vinil, não só pelo som, mas pelo projeto gráfico vir de uma forma amplificada. O importante é a sobrevivência da música, que a música exista. Se há suportes diferentes no mundo pra lançar, eu quero colocar todos à disposição do público. O público que vai baixar grátis ou o público que quer comprar e não quer comprar só o virtual, ele quer ter o objeto. A minha ideia é de ter essas linguagens todas, esses suportes todos pra diferentes pessoas.

Uma das faixas chama-se “Amar Como Jesus Amou”. Por que você a colocou no disco com uma melodia que lembra os video-games antigos?

Quem fez o arranjo foi um japonês chamado Toshiyuki Yasuda. Ele mora em Tóquio, só fala japonês, só que ele é fã do Pato Fu e foi várias vezes ver o nosso show. A gente já fez quatro turnês no Japão, tanto com o Pato Fu quanto solo. Eu já fui cantar solo, com orquestra e tudo. E ele dava os discos que ele produz lá. Ele é especialista nesse tipo de sonoridade, que parece trilha de Super Nintendo. Eu resolvi cantar essa música, porque na minha época de oito pra nove anos que eu tava começando a tocar violão e tocava ela na aula de religião. Eu estudava em escola de padre. Essa música sempre que acompanhou, porque é meio que um marco de quando eu comecei a tocar violão. Talvez, no Pato Fu, ela não passasse numa reunião. Mas no meu disco solo ela entra com essa memória afetiva. Não é porque eu sou católica, nem frequento Igreja, só em algumas poucas ocasiões. Mas acho que toda religião tem um aspecto muito positivo de iluminar a vida das pessoas em momentos difíceis, ou a pessoa quer falar, quer ouvir, ou quer olhar pro lado e ver alguém que compartilha um problema ou uma alegria com ela. Todas as religiões, com todos os seus defeitos, têm esse momento de reflexão e de uma palavra amiga. E eu acho que essa música, “Amar como Jesus Amou”, tem isso. Aí eu chamei o Padre Fábio [de Melo], que é o padre mais legal do Brasil. Um padre moderno, né. Há vários padres cantores, mas o Padre Fábio ele canta muito bem, mesmo. Ele tem um timbre bonito. Eu o conheci há alguns anos, a gente trocou livros, ficou falando por e-mail. Ele é um cara que é muito inteligente, gosto muito dele. E aí eu resolvi chamá-lo. Acho que era o meu par ideal pra cantar essa canção comigo.

A gente percebe que em vários trabalhos seus tem um pouco da criança que você ainda guarda em si, seja com o “Música de Brinquedo” do Pato Fu ou fazendo músicas com sons de video-game. Como você faz pra manter essa criança dentro de si e como isso te ajuda ao compor uma música ou escrever uma crônica?

Eu sempre fui muito rodeada de crianças, por ser eu ser a mais velha em casa, a minha mãe teve escolinha, então quando eu era pré-adolescente eu ia lá e tocava violões pros menininhos e pras menininhas, eu tenho uma filha que tem 10 anos. Então assim, eu sempre frequentei ambientes que tinham muitas crianças e eu sempre me senti muito à vontade e responsável por fazer coisas legais pra esse público. O “Música de Brinquedo” veio com essa intenção da gente deixar o público infantil sensível a um repertório pop de qualidade e que os pais não ficassem aborrecidos de ouvir um disco só pra crianças. A gente quis fazer uma coisa que tivesse essas camadas todas. Eu acho que o bom humor que eu tenho na vida é o que me faz ter esse espírito mais jovem sempre. Os problemas aparecem pra gente pular, resolver, enfrentar, bater, olhar depois. Eu não fico muito parada à frente das coisas, eu sempre dou um jeito de achar um caminho. E às vezes o caminho da diversão e da leveza é o melhor.

O “Na Medida do Possível” começa com umas vozes antes de “Doce Companhia”, que é uma música mais pra cima do que “Depois Que o Sol Brilhar”, que termina com o que pareceu uma partida de trem. Esses elementos se relacionam com o conceito que você criou pro disco?

Totalmente, totalmente. Como eu gosto de lançar o disco ainda, tem gente que gosta de lançar uma música ou duas. Mas eu gosto da ideia do álbum, eu gosto de ter uma seleção de músicas que conversam e a sequência delas é importante na minha cabeça. Pro ouvinte que gosta de ouvir mesmo que no carro ou sentar em casa e pegar o encarte, ele tem uma representatividade, o início com o fim do disco. ˜Doce Companhia” começa com um som de aeroporto, que é um lugar que eu frequento sempre, eu tô sempre ali. No meio do aeroporto, naquela confusão, uma coisa que eu faço muito é ouvir música. Aí coloco uma música tranquila e vou enfrentar o caos que é a viagem. Eu me isolo desse mundo através da música. E depois de “Depois Que o Sol Brilhar” é mesmo um trem. Que é a minha vida, eu to sempre viajando, né. Mesmo quando eu não vou a trabalho, que me faz viajar toda semana, quando eu posso eu vou viajar de férias com a minha filha e minha família toda, levo minha mãe, minha tia. Eu adoro viajar e olhar pro mapa do mundo e do Brasil, escolher uma cidade, saber que eu tenho como chegar lá. A coisa que eu mais gosto, que a minha carreira me proporciona, é eu ter dinheiro pra viajar. É eu poder levar minha filha lá pra Foz do Iguaçu, ou pra Nova Zelândia, e proporcionar essa experiência pra ela da viagem. Ninguém leva a sério esse direito humano de que todo mundo tem direito a viajar, a conhecer novas culturas, esse negócio pra mim é muito sério.

Tags:, , , ,

10/04/2014

Revista NOIZE

Revista NOIZE