.45 | Funkadelic pra ler e ouvir

06/01/2015

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Stéfanis Caiaffo

Por: Stéfanis Caiaffo

Fotos: Divulgação

06/01/2015

Em outubro passado, George Clinton entrou para o panteão dos literatos ao lançar, em colaboração com o jornalista Ben Greenman, sua autobiografia: Brothas Be, Yo Like George Clinton, Ain’t that Funkin’ Kinda Hard on You? O livro veio para somar informação sobre a incrível história do P-Funk junto a outro belo lançamento também de 2014, o ótimo George Clinton & the Cosmic Odyssey of the P-Funk Empire, esse assinado pelo jornalista inglês Kris Needs. Ambos acabam por formar o arcabouço mais contemporâneo possível sobre a vida e a obra não somente do gênio George Clinton, mas de toda uma geração que veio ao mundo com a nobre missão de dar à luz aquilo que seria conhecido no mundo inteiro como o P-Funk.

Além dos dois livros, porém, os aficionados pelo P-Funk comemoram ainda mais o lançamento, no último dezembro, de First Ya Gotta Shake the Gate, álbum que traz novamente à rua uma assinatura que fala por si desde os anos 70. Embora George Clinton tenha seguido importante em carreira solo ou com os P-Funk All-Stars e também como produtor, e tenha inclusive desbancado “Billie Jean” do topo das paradas de R&B com sua “Atomic Dog”, primeiro single da carreira solo, a cada vez que o nome Funkadelic reaparece, uma curiosidade imensa vem junto com ele. Ao longo dos anos 2000, depois de aparentemente resolvidos os problemas legais envolvendo a banda, dois outros discos já haviam sido lançados: By the Way of the Drum (2007) e Toys (2008).

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Se você não sabe quem é George Clinton, o que foi o Parliament-Funkadelic e o que é o P-Funk, vale uma rápida (tentativa) de explicação, ou pelo menos uma imagem aproximada. Junte num mesmo caldeirão o trabalho vocal dos grupos de Doo-Wop, o groove da Soul Music, as guitarras de Jimi Hendrix, a brutal atitude de palco de bandas como MC5 e Stooges, as fusões e experimentações que levaram Miles Davis a discos como In a Silent Way e Bitches Brew e também a fábula musical afrofuturista de Sun Ra e sua Arkestra; acrescente uma bela dose do discurso frontal dos Panteras Negras, outra boa dose do discurso da contracultura dos hippies e também alguns ecos da Guerra do Vietnã sobre um estado de coisas; depois de misturar bem, tempere tudo isso com drogas ilícitas que se possa fumar, cheirar, injetar ou colocar sob a língua e sirva em porções cavalares. Convide para presidir o banquete um dos três melhores chefs de uma época e para prepará-lo somente os melhores cozinheiros de uma geração. Vista todo mundo com fantasias inusitadas, compre uma espaçonave e junte 20.000 pessoas por show em sua turnê pela Terra. Dissolva tudo em problemas legais de todo tipo e pronto, eis George, a banda e o primeiro ciclo do P-Funk.

Uma tentativa de explicação mais sóbria diria tão somente que George Clinton foi um dos três maiores nomes da música Funk nos Estados Unidos, ombro a ombro com James Brown e Sly Stone. Ele reuniu simultaneamente em álbuns antológicos e sobre o mesmo palco nomes como William Bootsy Collins, Eddie Hazel, Fred Wesley, Maceo Parker, Bernie Worrell e outros do mesmo calibre. O ultraje musical resultante, espécie de crônica social afrofuturista que fez história como Parliament ou Funkadelic, criou uma mistura de groove, rock e psicodelia com inclinações conceituais que permanece sem precedentes até os dias de hoje, o P-Funk. Eles emplacaram nada menos do que 40 músicas nos charts de R&B dos Estados Unidos da época e quatro delas atingiram o topo de uma das listas mais concorridas da década de 70: Flashlight, Acqua Boogie, (Not Just) Knee Deep e One Nation Under the Groove. Ainda hoje, eles são os artistas mais sampleados da história da música negra norte-americana e influenciaram diretamente desde Afrika Bambaataa, Grandmaster Flash e Prince até Red Hot Chilli Peppers e Primal Scream. Alguns dos maiores clássicos dos anos 80 foram feitos com samples da odisseia P-Funk. O som dos sintetizadores de Bernie é apontado como o norte inicial da cena Techno de Detroit e eles são uma banda de Funk que está no Rock and Roll Hall of Fame. Não é pouco.

Se ainda assim não rolou, ouça o playlist do Funkadelic que fizemos no Rdio da NOIZE. Ele cobre cronologicamente todos os álbuns da fase áurea da banda, uma faixa por álbum:

Dito isso, vale dizer que o novo disco traz muitos dos P-funkers originais, mas incorpora também referências de R&B contemporâneo e a experiência que tiveram acompanhando as cenas do Boogie, da Disco e da música eletrônica em geral, e principalmente a cena do Hip-Hop desde o início. São 33 faixas inéditas num disco triplo de fresh funk que mistura o antigo ao novo numa nova tentativa de banquete. Se nossa nostalgia sempre vai colocar uma potência a mais na crítica ao disco, ele pelo menos é a trilha perfeita para os livros durante o seu verão: enquanto George e Ben desfiam sua versão sobre a história do P-Funk, Kris Needs ajuda muito numa escrita densa e precisa, fartamente documentada com entrevistas feitas ao longo das últimas décadas com a maior parte dos membros da banda – dissidentes ou não. Vale dizer que o disco é um lançamento independente do novo selo de George e foi co-financiado por fãs.

Sobre o disco, digo que gostei. O link está aqui: georgeclinton.com

O link para o livro de George Clinton e Ben Greenman está aqui: georgeclinton.com/book

O link para o livro de Kris Needs está aqui: omnibuspress.com

Afie seus ouvidos e seu inglês e vá em frente durante o verão.
E nunca esqueça, Funkateer: Free Your Mind and Your Ass Will Follow!!

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06/01/2015

Stéfanis Caiaffo a.k.a. Dr. Caiaffo é residente da Festa VooDoo, em Porto Alegre, e da festa Bossa Negra, em Santos.
Stéfanis Caiaffo

Stéfanis Caiaffo