Jaloo e Jup do Bairro contam histórias do underground na noite paulistana


Laura Diaz, Mia Badgyal, Katy da Voz e Irmãs de Pau também dividem experiências com a comunidade queer-artística na maior capital do país.
Por: Pedro Furlan

Pedro Furlan

Fotos: Divulgação/Larissa Queiroz, Polli Cavalcanti, Jeff, Lup911, Valdinei Souza, Holland, Ivi Maiga, Alan Gabriel

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A noite de São Paulo sempre foi um lugar de lendas urbanas. Embaixo das luzes piscantes e em pistas de dança cercadas pela maior cidade da América Latina, artistas se criam e se reproduzem, tendências nascem e desaparecem e uma cena abre suas portas para tudo que é “fora da curva”, como aponta Jaloo, e para todos os “corpos desviantes”, como diz Ivana Wonder.

Para apresentar o underground que borbulha no caos da metrópole, escolhemos sete artistas com histórias entrelaçadas à noite paulista, que narram como esse ambiente vive – e resiste.

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De artistas com décadas de carreira, como Jaloo e Teto Preto, até a atual geração, como Katy da Voz e as Irmãs de Pau, todos trazem sua própria visão sobre essa cena que, seja ao som de techno, house ou funk, origina momentos inesquecíveis.

JALOO

Um dos maiores nomes da música eletrônica e alternativa no Brasil, Jaloo – que é originalmente do Pará – mora em São Paulo há muitos anos. Marco na cena underground, Jaloo atualmente está rodando o país com a tour do álbum MAU (2023).

“O underground vai muito pelo diferente, pelo fora da curva – e eu lembro muito de sentir isso em um momento inesquecível, as festas na rua, de 2012 a 2014, no centro de São Paulo. Esse foi um período que me formou como artista. Nessa época, era diferente se sentir seguro na rua, então, quando iniciativas criaram esses movimentos de segurança, de experimento musical, de artistas do mundo todo tocarem, foi fantástico”.

JUP DO BAIRRO

Nascida no Capão Redondo, Jup do Bairro lançou seu primeiro álbum em 2020, Corpo Sem Juízo, mas, a artista está cena desde muito antes, com memórias no underground que se estendem desde 2014. Artista multimídia, Jup já está enraizada na noite paulistana e agora se expande para além dela, lançando até feat com a deputada Érika Hilton.

“O underground é movimento, possibilidade, caos, fortalecimento, revolta, subversão e comprometimento com a estética não-estática. É gerador de referências e de cultura, ainda que diminuído e pouco remunerado – inclusive, destaco o coletivo Liquidação, um dos filhos de Voodoohop que foi fundado pelo saudoso Volatille Ferreira, pioneiro de si e que fez tanto pela arte brasileira.

Para mim, o momento que realmente marcou o underground paulistano foi a edição de 2017 do SP na Rua – era tudo muito utópico, mágico, ali a cena estava muito fervorosa, praticamente todos os artistas ocupando as ruas do centro de São Paulo. Havia um movimento e uma revolta política muito grande, uma necessidade de estar na rua”.

LAURA DIAZ

Laura Diaz, vocalista da banda Teto Preto e também conhecida como Carneosso, é um dos pilares da cena underground paulistana. Uma das criadoras da famosa festa Mamba Negra, Laura também lançou o segundo álbum da Teto Preto no final do ano passado, FALA.

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“O underground, para mim, é underGRANDE. Somos um movimento brasileiro de festas independentes e de rua que encontrou na cultura eletrônica LGBTQIAPN+ um território de conquista de futuras, profissionalização, trabalho, reconhecimento e afeto para toda uma geração de artistas e atuadores da cultura que se renova ao longo dos anos.

Essa cena já proporcionou momentos fundamentais como, no aniversário de 4 anos da MAMBA, em 2014, quando tentaram nos cancelar com perseguição de alvarás e saímos num trio elétrico no 1⁠º ATO PELA LIBERDADE DE ATUAÇÃO EM SP. A gente passou pela D-Edge, onde solenemente mostrei a bunda, e continuamos até a prefeitura – bons tempos estes em que podíamos ocupar as ruas

Ressaltaria também nosso show de 10 anos da TETO com Marina Lima nos 11 anos da Mamba e nossa última festa de 2024, que o Nunes brecou de ser na rua e gratuita e nós giramos a festa toda para mais de 3 mil pessoas para Jurubatuba, ainda gratuita. Estreamos o espetáculo do nosso 2⁠º álbum, FALA, nessa MAMBA, e foi muito foda ver esse momento de força, afeto, tecnologia, articulação e excelência a nossa cena que se renova apesar das dificuldades. Foi uma conquista coletiva”.

IRMÃS DE PAU

Quando o assunto é funk, as Irmãs de Pau são uma das maiores apostas. Originárias da Zona Oeste, Vita e Isma se solidificaram tanto na cena quanto fora. Após subir no trio da Pabllo Vittar neste Carnaval, a dupla lançou sua primeira colaboração internacional, e está prestes a lançar a segunda parte do álbum Gambiarra Chic (2024).

Isma:

“O underground é quem consegue provar que o que a gente faz, mesmo não estando no que é considerado rentável pelo mercado, também é uma potência, tem seu valor, seu significado na cultura – pode o pensamento das pessoas e trazer revoluções. Por causa disso, para mim, o After, o álbum de remix da Pabllo Vittar, foi histórico. Ela juntou muita gente do underground atual e isso rendeu para todo mundo – foi um momento muito especial de uma artista grande, mainstream, ter olhado para a cena underground, feito uma curadoria e potencializado todo mundo”.

Vita:

“Fico muito feliz por sermos artistas que não precisam de empresários ou grandes marcas para colocar nosso nome na história da música do Brasil, especialmente do funk. Nesse underground, a gente, por ter muita liberdade de criar, traz uma inovação, um frescor, que ninguém mais consegue ter – estamos produzindo e inspirando outras formas de resistência, outras formas de vida. Por isso, ter colaborado com Jup do Bairro, lá no começo, foi muito marcante”.

MIA BADGYAL

Direto da Zona Leste, Mia Badgyal é um dos nomes mais conhecidos na noite paulistana. A cantora e estilista está na cena desde 2017 e conta com apresentações em locais tradicionais do underground, como a Mamba Negra, e em ambientes mais mainstreams, como abrindo os shows de Charli xcx e Ashnikko – além de estar prestes a lançar o segundo álbum de estúdio no primeiro semestre desse ano. 

“O underground é a raiz e o fundamento de todo movimento, é, para mim, é a semente das possibilidades – além de onde eu pude realmente saber que meu trabalho alcança artistas de todo o mundo e onde pude me conectar com esses artistas na vida e nos palcos.

Estar com a Charli e Ashnikko foi um exemplo disso. Como artista independente brasileira sempre fui desacreditada de chegar nesses lugares e pessoas, mas a música foi capaz de mudar isso, foi através dela que tive o poder de conectar e espalhar a minha mensagem”.

KATY DA VOZ

Vocalista do trio Katy da Voz e as Abusadas, que se destaca na cena do funk paulista, Katy nasceu no Grajaú, no extremo sul de São Paulo, e, nos últimos anos, tem assumido seu local na cena como artista travesti e punk, ambas identidades ocupando o mesmo local em sua visão.

“O underground anda lado a lado com o punk, que anda lado a lado com ser travesti, então, acho que tudo isso se une em um só movimento. É sobre isso, não fazer nada do que as pessoas estão acostumadas, sempre querendo provar que outros tipos de pessoas também existem.

Sempre participei dessa cena, então hoje em dia ver as pessoas, que trazem o underground à tona, cantando as nossas músicas, foi um dos momentos mais importantes para mim. Acho que o underground não é uma cena que a gente pede para entrar, é algo muito mais vital”.

IVANA WONDER

Conhecida pelo estilo marcante como drag queen, Ivana Wonder é ícone da noite paulistana há mais de 10 anos, já tendo passado por inúmeras festas, boates e palcos. Explorando a música eletrônica em seu duo Vermelho Wonder, e a MPB melancólica no seu projeto solo, a artista se provou um dos nomes mais versáteis do underground.

“O underground significa para mim esse berço, esse espaço dos artistas desviantes, corpos desviantes, é o lugar dos weirdos. Acho que é esse espaço que abraça esses artistas que estão um pouco a margem do mainstream – e para mim, isso foi muito importante, poder conhecer e trabalhar com as pessoas que eu admirava quando era adolescente, vendo nos blogs. Lembro até hoje da primeira apresentação do Vermelho Wonder e ver a Honey Dijon, que ia tocar logo em seguida, nos aplaudir por quase um minuto, foi extasiante”.

Por: Pedro Furlan

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Fotos: Divulgação/Larissa Queiroz, Polli Cavalcanti, Jeff, Lup911, Valdinei Souza, Holland, Ivi Maiga, Alan Gabriel

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