
Aos 30 anos, Daniel Garcia é um veterano do mundo artístico. Ele estreou em 2002 no grupo musical A Turma do Balão Mágico. Depois, passou pelo cinema e pela televisão, como ator e dublador. Em 2014, sua carreira dá uma guinada, com Gloria Groove.
Como drag queen, lançou 4 álbuns: O Proceder (2017), Lady Leste (2022) – este conta com grandes hits “Bonekinha”, “Leilão” e “Vermelho” – Futuro Fluxo (2023).
No ano passado, veio o projeto mais ambicioso: Serenata da GG (2024). Dividido em parte um e dois, álbum explora o pagode, gênero que influenciou o pequeno Daniel e hoje ganha espaço na carreira da drag queen.
Com produção de Rafael Castilhol, o projeto conta com participações da mãe de Gloria, Gina Garcia. Com Alcione, encanta em um dueto da poderosa “A Loba”. O disco ainda inclui Ferrugem, Belo, Thiago Pantaleão, Grupo Menos é Mais, Thiaguinho, Mumuzinho, Sampa Crew e Ana Carolina.
O álbum consolida Gloria Groove como a drag do amor, diva pop romântica, do funk ao pagode. Headliner do Festival Turá e com show especial marcado para o dia dos namorados no Espaço Unimed, ela conta que, com a era Serenata da GG (2024), vive um eterno dia dos namorados.
Festival Turá anuncia line up; Gloria Groove, Seu Jorge, Samuel Rosa e muito mais
Em entrevista à Noize, a artista fala sobre possível carreira internacional, próximos shows, a redescoberta do romantismo e inspirações musicais.
Como está sendo fazer a turnê do Serenata da GG (2024)? Por que você sentiu a necessidade de fazer um show com essa pegada mais romântica?
Desde 2023, vinha redescobrindo meu processo criativo e tentando entender os sinais que a vida estava me mandando. Um dos mais claros, era o pagode. Não só pela minha origem e pela minha história com o pagode desde criança, mas também por conta das várias parcerias e bons momentos que eu tive, desde 2012, com o pagode, muito antes de eu pensar em fazer meu próprio projeto.
[O pagode] é um lugar que me recebe muito bem, de braços abertos. Mas, mais do que isso, é um lugar onde eu posso fazer o que eu gosto, que é o R&B, cantar sobre amor, de um jeito muito brasileiro. De diversas formas, representa uma volta para casa. Me lembra alguns dos melhores momentos que eu vivi com a minha família, na infância, e como a nossa vida mudou, por conta do pagode também.
Era como se eu tivesse a chance de me declarar, dar flores em vida. No Serenata da GG (2024), eu gravei mais uma música com a minha mãe, eu me declarei para o meu marido, dediquei todo um projeto para a minha tia Soraya, que é a pessoa mais apaixonada que eu conheço. Serenata da GG (2024) me dá a sensação de estar em casa.
E eu também queria poder celebrar a nossa cultura, que fosse a cara do Brasil. Estou sentindo os efeitos disso, com o sucesso das músicas nas rádios do Brasil todo, é uma coisa que eu atrelo a esse trabalho. A experiência na estrada com a turnê é muito gratificante, porque eu sinto que estou desbravando novos territórios. E eu sou essa pessoa, quero estar em todos os lugares que sinto que posso continuar crescendo e me redescobrindo.
O que o público pode esperar do show no festival Turá? A preparação de um show de festival é diferente da turnê do Serenata?
Eu amo fazer show em festival. Tem a sensação de ver no gargarejo todo mundo que está comigo, em todos os momentos, e ver o pessoal lá do fundo, passando e pensando: “Vamos ver como vai ser esse show”. Festival é uma hora de troca e apresentação. Eu amo a sensação de renovação que o palco de um festival dá. É a chance de apresentar o trabalho para alguém que ainda não viu e quem nem imagina que ia gostar das músicas.
Outra coisa que me alegra nesse dia é o fato de ser a primeira vez que serei headliner com o Raça Negra, que é um grupo que está na minha vida desde o dia que eu nasci. É um dia que vai ficar para história, por vários motivos. Fazer Serenata da GG para esse público vai ser muito gostoso, apresentar o repertório, mas também é sobre pensar o que não pode faltar do resto da carreira, que a gente tem que separar um tempinho ali no final para cantar. Animação total, acaba virando uma festa.
O show no Espaço Unimed é especial do Dia dos Namorados. O que você pode abrir sobre detalhes da apresentação para gente?
Dia 13 de junho, no Espaço Unimed, vai ser um dia muito especial para mim. Porque é o dia em que vamos celebrar o sucesso de Serenata da GG (2024) como um todo, já que o show de estreia da turnê também foi lá e rever tudo que a gente viveu. Também estou investindo tudo que eu tenho no coração para trazer para as pessoas uma experiência realmente especial.
Esse dia celebra o aniversário da era, celebra o dia dos namorados, que tem tudo a ver com tudo que Serenata fala, celebra o mês do Orgulho, que conversa muito com o nosso direito de amar, celebra o mês da festa junina, que fala sobre amar no friozinho [risos].
Vamos celebrar tantas coisas gostosas, e que tem a cara de Serenata ao mesmo tempo, então, eu espero que os fãs se divirtam muito, com o novo repertório, com as novas ativações e com todas as potenciais surpresas, que a gente pode trazer esse dia, que eu vou guardar um pouquinho [risos].
O que te interesse mais em cantar o amor? Você sempre foi aberta a falar sobre sentimentos?
Nem sempre eu fui uma pessoa aberta a falar sobre sentimentos, não é algo de mim. Eu sempre fui uma criança afeminada, sou de São Paulo, capricorniana, então meu foco sempre esteve tão em mim, na minha parada, minha jornada, o amor era uma coisa tão incomum, tão improvável na minha cabeça adolescente.
Há 10 anos, quando eu conheci o Pedro [Luís], eu acho que eu aprendi o que é amor. Foi o que eu tentei registrar ali em “O Dom da Vida” e “Linguagem do Amor”. Serenata da GG (2024) também está ali para isso. Foi quando eu comecei a aceitar que, colocar os meus sentimentos para fora, enquanto é tempo, tinha uma importância vital para eu continuar vivendo meus sonhos e protegendo a minha criatividade, sabe?
Eu agradeço a era Serenata por ter desbravado em mim e ter desbloqueado essa drag rainha do amor, que eu acabei descobrindo esse lugar no coração do Daniel também. Eu consigo, sim, ser sentimental, me emocionar.
Quantas vezes, durante o processo criativo de Serenata, eu não desabei de chorar no estúdio? Foi ali que eu percebi que estava fazendo algo que ia me comunicar com as pessoas. Dentre muitas coisas, esse disco vem para me ensinar a aceitar mais minha vulnerabilidade e deixar a emoção falar mais alto.
Serenata da GG (2024) é romântico e intenso, tem uma pegada diferente das suas outras produções. O que mudou de um álbum para outro e na Gloria como artista? Quais caminhos você enxerga explorar no futuro?
Me engrandeço como artista quando mostro para as pessoas que me limitar não está nos meus planos. Eu sempre pretendo estar expandindo os meus horizontes, mas, mais do que isso, o quanto agrega no meu crescimento pessoal.
Quando eu mostro para mim mesma do que eu sou capaz, que eu ainda tenho muitas barreiras a derrubar…. como é gostoso sair da minha zona de conforto, descobrir outras coisas. Quando eu sinto que algo me engrandece e me dá uma nova perspectiva como ser humano, como Daniel Garcia, aí tenho certeza que isso vai fazer a Gloria Groove chegar em outro lugar, artisticamente.
Com Serenata da GG (2024), essa é exatamente a minha sensação. Eu fico tão feliz com o lugar que esse trabalho já reservou no coração dos brasileiros. Quantas histórias de amor eu ainda posso escrever dentro das páginas da Serenata da GG (2024)? Isso que muito me alegra.
Podemos falar que a Gloria Groove entrou em uma nova fase musical? Como você definiria esse momento artístico?
Eu gosto de ver esse momento artístico como: Gloria Groove mostrou mais uma das suas skills. Criativamente, eu nunca estou parado, eu sempre estou interessado por muitas coisas ao mesmo tempo. É um pouco de rap, hip hop, R&B, teatro musical, diva pop.
Eu misturo tanta referência que preciso de muito espaço para conseguir mostrar tudo isso para as pessoas e me comprometer com uma coisa de cada vez ou decidir como eu consigo fazer tudo junto. Eu gosto de encarar essa fase apenas como mais um momento, pelo qual a gente vai passar, e ainda vai descobrir várias outras Glorias.
Você está trabalhando em algum novo material?
Esse ano eu estou investindo muito mais tempo em estudar e em estar dentro do estúdio. Porque ano passado eu mal fiz isso. Eu pretendo estar mais tempo viajando, vivendo bons momentos, para manter minha cabeça criativa viva e funcionando.
Eu tenho passado muito tempo fora do país também, estudando o que pode ser, um dia, se tornar a minha carreira internacional, independente se ela vai ser a carreira da Gloria Groove ou do Daniel Garcia. Estou meio que retomando todos os sonhos que eu tinha antes, e que precisava de mais espaço e conforto para voltar a focar neles.
Então, sim, estou criando o tempo todo. Sempre que vocês me virem por aí, cumprindo agenda, pode ter certeza que no off, durante a semana, eu estou enfiado no processo criativo e estou gostando muito de viver isso de novo.
Ano passado, eu realmente mal consegui experimentar a criatividade. Em 2025, meu ano dos 30 anos, preciso estar criando. Pra mim, escrever músicas e planejar a própria vida, é meio que roteirizar o meu próprio futuro, sabe? Eu posso ser o roteirista, o diretor e a estrela do meu próprio futuro, através do que eu crio.
E a carreira internacional, quais são seus planos?
Eu sempre sonhei com essa carreira, principalmente por causa da minha conexão com a cultura estadunidense, que me influenciou demais quando criança. Eu como uma gay millennial, obviamente tive referências de sobra de divas pop, das séries que amei.
A mesma coisa com o espanhol. Gostar de artistas que falam espanhol marcou a minha vida, com RBD ali atrás, e depois com todo mundo do reggaeton, que eu já amava e hoje com o estudo acabei amando ainda mais. São 2 coisas que eu procuro fortalecer muito, e não deixar nenhuma língua de fora. Além de tudo, eu gostaria de trazer o português-brasileiro junto comigo.
A minha experiência no Grammy Latino para eu ter muita vontade de ver o Brasil em destaque. De ver o português-brasileiro como uma língua que o pessoal quer falar. Me interessa poder levar a cultura do meu país para fora e também aprender com todo mundo que está lá.
Além das músicas do novo repertório com Serenata da GG (2024), o público pode esperar algumas das faixas mais antigas e icônicas nas próximas apresentações? Quais músicas não ficam de fora do seu setlist?
Serenata da GG (2024) sempre foi sobre isso. Eu quis trazer um conjunto de inéditas com um conjunto de faixas da minha carreira que eu sempre quis fazer em pagode e também com nostalgias inusitadas, que eu falei: “vamos cantar juntos, mesmo eu ainda não tendo ouvido essa em samba”, que é o caso das músicas da Ana Carolina.
Eu amo essa sensação de coletânea que a era Serenata dá, e estou planejando surpresas dentro desse lugar das novas versões, porque é um sucesso de eras da internet. Eu lembro do fenômeno de ouvir “Diamonds” da Rihanna em versão pagode ininterruptamente, quase achando melhor que a original [risos]. E estou amando muito a experiência de abrasileirar minhas experiências de fora, através dessa era.
A identidade do álbum é muito única, como suas outras produções. Mais do que um álbum, é uma experiência visual e de performance, dos figurinos a coreografias. Como você participa dessa concepção artística? Como a parte visual é importante para a música?
A concepção artística vem inteiramente de mim. Ela nasce em conjunto com o processo de criação musical. Quando eu comecei, eu só tinha na cabeça que eu queria fazer um projeto de pagode, então eu ouvi algumas músicas, porque eu não tinha certeza do que eu queria escrever sobre.
Quando eu ouvi e gravei algumas coisas, foi quando entendemos que eu precisava abrir meu coração e falar das minhas próprias experiências. Dentro desse processo criativo, de anotar histórias da minha própria vida e querer transformar em músicas de amor, eu entendi que, eu não estava fazendo algo sobre pagode, mas sim sobre amor.
A conta que estava na minha frente é. Pagode = sentimento = relacionamento. Drag = exagero = maximalismo. Então, se eu unir as duas coisas e somar o romance, com o exagero e o maximalismo, eu chego na máxima do amor, um eterno dia dos namorados. Eu entendi que precisava trazer essa festa do amor para dentro dos visuais de Serenata da GG (2024).
Fazia todo sentido ter uma drag queen dentro do pagode, querendo celebrar o amor do jeito mais exagerado possível, quase que da forma que fazíamos nos anos 90. Entendi a conexão profunda com os anos 90, que é a década em que eu nasci, tanto com a sonoridade do pagode e do R&B, quanto da estética visual, dos programas de namoro e de pegação.
Foi ali que eu entendi que a atitude drag seria um híbrido com os pagodeiros que eu mais amo com as apresentadoras de TV da MTV que eu mais amo também. Eu fico muito feliz com o conceito visual que a gente chegou, porque ele espelha perfeitamente o universo musical do álbum, onde eu enxergo esse som acontecendo.