ESPECIAL

O Norte do Azymuth

Unindo jazz ao funk e samba ao rock progressivo, Azymuth encontrou trilhas inéditas


Por: Ariel Fagundes

Ariel Fagundes

Fotos: Acervo Azymuth

<div>A música brasileira como a conhecemos só existe enquanto tal por causa destes três nomes:<strong> Alex Malheiros, José Roberto Bertrami e Ivan &#8220;Mamão&#8221; Conti</strong>. Nascidos no mesmo ano de 1946, Alex (baixo), Zé (teclas) e Mamão (bateria) foram decisivos para a construção da sonoridade de álbuns de artistas tão variados quanto <strong>Jorge Ben e Raul Seixas, Elis Regina e Clara Nunes, Milton Nascimento e Odair José. </strong></div> <div></div> <div>Inicialmente, os três se notabilizaram enquanto músicos de apoio, mas a partir dos anos 1970, o Azymuth passou a ter uma importante carreira internacional. Aos 77 anos, Alex Malheiros tem o desafio e a honra de ser o último membro original do Azymuth, após as passagens de José Roberto (2012) e Ivan (2023). Aqui, ele conta que não faz ideia da quantidade de países em que já tocou com o trio — sabe apenas que foram em todos os continentes. Enquanto esta edição foi feita, Alex se preparava para gravar o novo disco da banda, ao lado de <strong>Kiko Continentino</strong>, que assumiu as teclas desde 2015, e o baterista <strong>Renato Massa</strong>, que substituiu Mamão.</div> <div></div> <div>O marco inicial desta crescente discografia foi o álbum <em>Azimüth</em> (1975), que começou como um projeto independente. Inclusive, seus custos de gravação foram pagos através do escambo: a banda gravou outro disco, sob encomenda do dono do estúdio, para custear o seu próprio trabalho. Antes disso, o álbum havia sido concebido nos estúdios caseiros de Bertrami, em sua casa no bairro de Laranjeiras, no Rio de Janeiro, onde o grupo ensaiava e fazia gravações.</div> <div></div> <div>É interessante que o termo &#8220;home studio&#8221; — hoje, banal — nem existia naquela época. Eram tempos em que os músicos brasileiros mal tinham acesso a instrumentos profissionais, que dirá a equipamentos de gravação para montar um estúdio na garagem. Mas de certa forma era como se o Azymuth já vivesse com a cabeça no futuro, em uma dobra do tempo repleta de timbres sintetizados e muito groove.</div> <div></div> </p>

 

*

<div><strong>O Azymuth desenvolveu uma sonoridade muito única, como foi a criação dessa linguagem?</strong></div> <div></div> <div>Não tinha um nome para o nosso negócio. Não era jazz puro, era uma coisa misturada, música brasileira com jazz, com muitas tendências. A gente ouvia tudo. Todos da mesma idade, do mesmo ano: 1946. Baby boomers, né? Tínhamos uma formação eclética, com os músicos americanos, e as coisas do Brasil, como <strong>Radamés Gnatalli</strong>, e os cantores, <strong>Cauby [Peixoto], Sílvio Caldas, João Gilberto. </strong></div> <div></div> <div>E dessa brincadeira, foi se moldando o swing do Azymuth. Fomos pegando isso tudo e fazendo músicas. Não copiando, nada disso, fazendo coisas que tinham a ver com funk, com progressivo, com o Brasil. Já no primeiro disco. E até alguma coisa cantada, que fomos obrigados pra entrar no mercado do Brasil.</div> <div></div> <div><strong>Vocês já acompanhavam outros músicos no início dos anos 1970, mas como foi o momento em que vocês decidiram criar um projeto de vocês?</strong></div> <div></div> <div>A princípio foi eu e o Bertrami. A gente era músico da <strong>Eliana Pittman</strong>. Novinhos, com 20, 21 anos, e já tínhamos acompanhado muita cantora. O Bertrami era sensacional. Grande cabeça, além de ser um músico minimalista maravilhoso. Foi ele que deu oportunidade pra a gente estar aqui até hoje, porque a ideia foi dele: &#8220;Vamos fazer um negócio pra gente?&#8221;. A ideia era juntar dinheiro, investir em instrumentos, e foi o que a gente fez. Trouxemos instrumentos que estão aí até hoje.</div> <div></div> <div>Já tínhamos uma química, né? Mas não era show, era baile. A ideia do Zé foi esta: fazer um baile baseado num conjunto paulista chamado <strong>Modern Tropical Quintet</strong>. Foi aí que nós chamamos o Mamão e mais uma cantora chamada<strong> Fabíola</strong>. O início do Azymuth foi esse, tem até um disco [<em>4 Sucessos Volume 2</em> (1972)], a gente se chamava de <strong>Grupo Seleção</strong>. E a bateria do Mamão é única. Quando a gente conheceu o Mamão, ele já tocava um rock diferente de todo mundo, porque ele ouviu outras coisas. Não só ouvia rock, ele conhecia muitas coisas.</div> <div></div> <div><strong>E como foi essa época?</strong></div> <div></div> <div>Fizemos baile, mas nada deu certo. A única coisa era que o pessoal gostava e batia palma. Já era uma prova de que o negócio era bom.</div> <div></div> <div><strong>Mas como foi o surgimento do Azymuth mesmo?</strong></div> <div></div> <div>A gente lançava muita coisa, não nossa, mas com outros cantores, acompanhando e produzindo. Foi uma época de muita gravação no Brasil, &#8220;Disco é Cultura&#8221; era o lema, e nós trabalhávamos muito em estúdio e gravávamos juntos. Aí chegou uma hora que a gente falou assim: &#8220;Por que não fazer o nosso negócio também? A gente tem música&#8221;. O Bertrami, o Mamão e eu tínhamos, e fazíamos músicas juntos.</div> <div></div> <div>Aí começamos a ensaiar. No fim de semana, em vez de eles irem pro futebol — eu não, eu fora de futebol —, a gente ia pra casa do Bertrami, que já era o embrião de um estúdio de gravação. Na época, a gente já gravava pequenas coisinhas, até pra jingles, com uma máquina de quatro canais. A gente começou a ensaiar as nossas músicas e fomos guardando.</div> <div></div> <div><strong>Como foi a história do nome, &#8220;Azimuth&#8221; era uma música do Marcos Valle, né?</strong></div> <div></div> <div>Que já existia, eles já tinham gravado pra uma novela, <em>Véu de Noiva</em> (1969). Quando fizemos o disco com <strong>Marcos Valle</strong>, <em>O Fabuloso Fittipaldi </em>(1974), Azimuth na verdade era o conjunto de estúdio. Nesse caso, não podiam colocar o nome de Marcos Valle, que era o autor de todas as músicas, porque o Marcos era contratado da EMI-Odeon [e o LP em questão era da Philips], então botaram o nome de Azimuth.</div> <div></div> <div>Mas o Marcos sempre foi um grande amigo, foi uma inspiração até para o nome. É a nossa inspiração. Quando a gente conseguiu o nome, aí a gente consolidou a coisa. Aí começamos a trabalhar no disco. Fomos fazendo em casa, fizemos tanta coisa que saiu até uma colcha de retalhos, que nós tínhamos guardado do estudiozinho do Zé Bertrami, da casa dele, lá em Laranjeiras. A <strong>Far Out</strong> lançou, e está indo bem, já tem anos. O último disco do Azymuth lançado foi esse [<em>Demos (1973-75) Volumes 1 &amp; 2</em> (2019)]. Uma coisa de 50 anos atrás.</div> <div></div> <div><strong>O disco de 1975 teve a gravação custeada pela banda, como foi isso?</strong></div> <div></div> <div>O estúdio original da Polygram era na Avenida Rio Branco, e ia se mudar para a Barra [da Tijuca], mas não estava pronto, e eles tiveram que sair da Rio Branco. E o equipamento da Polygram foi todo para o estúdio Havaí, que era de um amigo nosso, o<strong> William Luna</strong>, atrás da Central do Brasil. Então, fomos pro estúdio desse amigo. Pra pagar, a gente fez um disco pra ele. Essa é boa, né? Ele era sanfoneiro de música raiz, aí fizemos pra ele. Porque a gente gravava tudo, a gente tocava qualquer coisa.</div> <div></div> <div><strong>Você lembra que disco foi esse?</strong></div> <div></div> <div>Não sei como era o nome. Mas nós fizemos, pagou o estúdio, e ele ficou feliz.</div> <div></div> <div><strong>O LP de vocês saiu com um texto da banda falando que o disco foi feito sem interesse comercial, era isso mesmo?</strong></div> <div></div> <div>Não havia interesse. A gente queria lançar o nosso trabalho, queria fazer um disco mais instrumental. A &#8220;Linha do Horizonte&#8221; surgiu no meio da história. Por quê? Porque a gente era muito amigo do pai do <strong>Cazuza [João Araújo, executivo da gravadora Som Livre em 1975]</strong>. E aí, na hora que vendemos o disco, sem essa canção, ele perguntou se a gente não gravaria uma música pra novela. &#8220;Vamos lançar esse disco então, mas gravem uma música? Tem uma novela que vai sair agora&#8221;.</div> <div></div> <div>E ele pediu pra colocar voz. Nós já tínhamos uma música de um amigo, o João Paraná, que trabalhava com a gente — fazia de tudo, técnico, secretário, músico — e tinha umas músicas boas. E pedimos ao <strong>Paulo Sérgio Valle</strong>, que era nosso amigo, pra colocar uma letra. Eles pediram uma música pra aviação, e o Paulo tinha uma letra e encaixou. A princípio seria sobre o mar, mas ele adaptou todinha. Ele era piloto também, por incrível que pareça.</div> <div></div> <div>Aí virou a música de trabalho do Azymuth. Entrou no foco, entrou nas rádios. Naquele tempo, a gente tinha uns negócios com rádio também, fazíamos jingles e vinhetas pra uma rádio muito importante, a Rádio Mundial. A gente era os Reis da Vinheta, basta dizer que muitas músicas da gente são vinhetas que a gente fez pra Rádio Mundial.</div> <div></div> <div> <div><strong>O disco tem faixas como &#8220;Melô dos Dois Bicudos&#8221;. que brincam com os lados das caixas de som, vocês estavam pensando o estúdio também como um instrumento?</strong></div> <div></div> <div>É o chamado [efeito] panorâmico, né? A gente grava em vários canais até hoje, mas na verdade o final é sempre estéreo. É esquerda, direita e meio. O meio é imaginário, mas existe, está no meio porque está nos dois falantes. O técnico na época era o Ary Carvalhaes, um baixista maravilhoso — super amigo, aprendi muito com ele — e além de músico, era técnico de som.</div> <div></div> <div>Foi ideia do <strong>Ary Carvalhaes</strong>, na hora da mixagem. No final, ele mixou dessa maneira. Nós gravamos em oito canais, era fita de uma polegada. Era uma cacetada. Hoje em dia, essas porcarias de gravação digital não chegam nem aos pés. É a minha opinião, né? Tem gente que adora.</div> <div></div> <div><strong>Queria ouvir você sobre o pioneirismo do Azymuth.</strong></div> <div></div> <div>A gente estava correndo atrás do instrumento, no Brasil ninguém tinha, muito pouco. A gente viajava pra buscar, antes do Azymuth até. É muito complicado ser brasileiro e não ter instrumentos. Nem tinha nem pensava-se em ter.</div> <div></div> <div><strong>A relação de vocês com os timbres eletrônicos começa por aí?</strong></div> <div></div> <div>Começa. Antes mesmo do Azymuth, compramos o Rhodes, o Hammond, sintetizadores. A gente guardava uma grana e ia. A gente ganhava bem — graças a Deus e ao &#8220;Disco É Cultura&#8221; —, aí íamos lá e comprávamos. Junto com <strong>Herbie Hancock, Yes, Emerson, Lake &amp; Palmer</strong>, somos mais ou menos da mesma idade, da mesma geração. Compramos os instrumentos eletrônicos junto com todo mundo que estava mexendo com isso na época. Todos que estavam mexendo com música de vanguarda estavam na mesma sintonia, na nossa mesma vibe, atrás de instrumentos eletrônicos. Já chegamos no Azymuth, no primeiro disco, com instrumentos eletrônicos, o Arp String, o Rhodes, o clavinet.</div> <div></div> <div>Na verdade, a gente ouvia tanta coisa. A gente escutou o Mellotron e: &#8220;Pô, a gente tem que comprar esse instrumento&#8221;. Chegamos numa loja em Nova York, o cara que era dono da loja passou a ser nosso amigo, aí ele falou assim: &#8220;Não, não vai comprar esse troço, não. É muito dispendioso. Tem um tal de Arp String aqui&#8221;. Aí vendeu pra gente, aí foi o começo de tudo. Azymuth grava com Arp String no primeiro disco. O Moog a gente já tinha, o Rhodes também. Mas o Arp String foi o grande elo para o Azymuth entrar no mercado com instrumentos modernos.</div> <div></div> <div><strong>Como vocês traziam?</strong></div> <div></div> <div>Era tudo proibido. Aquilo era o tempo da Ditadura. A única coisa boa da Ditadura era o &#8220;Disco É Cultura&#8221;, a gente criou nossos filhos fazendo isso. As grandes gravadoras, Philips, não sei o quê, gastavam uma fortuna fazendo disco, e também não fazendo.</div> <div></div> <div><strong>Como assim?</strong></div> <div></div> <div>Aí era o segredo deles. Não fazia o disco, mas dizia que fazia.</div> <div></div> <div><strong>&#8220;Disco É Cultura&#8221; era uma política de incentivo fiscal, você está falando que elas forjavam discos pra isentar de imposto?</strong></div> <div></div> <div>Claro, óbvio. Mas o &#8220;Disco É Cultura&#8221; foi bom porque nossos filhos cresceram, hoje em dia são médicos, advogados, não sei o quê. Graças ao &#8220;Disco É Cultura&#8221;.</div> </div> </p>

"Todos que estavam mexendo com música de vanguarda estavam na nossa mesma vibe"

<div><strong>E o disco de 75 tocou nas rádios na época?</strong></div> <div></div> <div>Tocou, &#8220;Manhã&#8221;, &#8220;Linha do Horizonte&#8221;, &#8220;Esperando minha vez&#8221;&#8230; Vi uma vez um programa de surf na TV que a vinheta era &#8220;Esperando minha vez&#8221;. Entraram numas de que era esperando a vez de pegar a onda, eu acho.</div> <div></div> <div><strong>Foi um disco bem sucedido?</strong></div> <div></div> <div>Não foi um disco bem sucedido. O que foi bem sucedida foi a música &#8220;Linha do Horizonte&#8221;. Ela deu amplitude para o nosso nome. Muita gente ainda conhece só essa música do Azymuth até hoje. Então foi de uma importância vital. Mas a importância do disco foi que ele conseguiu trazer à tona a nossa ideia de fazer música. O pessoal da época não compreendeu, os críticos não compreenderam absolutamente nada. Só atrapalharam.</div> <div></div> <div><strong>Tinha críticas contra vocês?</strong></div> <div></div> <div>Claro que tinha. Cronistas de samba, famosos na época — eu esqueço, nem sei mais o nome —, esculhambaram a gente, diziam: &#8220;Isso não tem nada de Brasil, é música americana&#8221;. Não entendiam absolutamente nada, não sabiam o que era música. Hoje em dia, não. O pessoal já entende um pouco mais.</div> <div></div> <div><strong>Vocês chegaram a fazer turnê com o disco de estreia?</strong></div> <div></div> <div>Fizemos. Tinha o <strong>Projeto Pixinguinha Instrumental</strong>, e fizemos. Ainda não éramos conhecidos, mas estava começando. Era um projeto da Funarte, ela que bancava isso, fizemos o Sul e fizemos o Norte. Só que no Norte fizemos com uma cantora e um grupo de músicas folclóricas do Tocantins.</div> <div></div> <div><strong>A música &#8220;Brazil&#8221;, escrito com Z, remete a um olhar pro exterior. Vocês já estavam querendo falar com o público estrangeiro desde o primeiro disco?</strong></div> <div></div> <div>É, já. Com certeza. Já estávamos pensando em tirar o time, era o que a gente sempre pensava. Tem até uma música aí minha nesse disco em que eu falo isso: &#8220;Vivo cá embaixo aperriado esperando a minha vez&#8221;. É mais ou menos isso, embaixo que eu digo – eu não, minha irmã, que botou a letra –, é o Hemisfério Sul.</div> <div></div> <div><strong>Vocês sentiam que não tinha mercado pra música do Azymuth no Brasil?</strong></div> <div></div> <div>Não, de jeito nenhum. A gente não acreditava. Por isso que fizemos a &#8220;Linha do Horizonte&#8221;, foi uma sorte muito grande porque fez com que o nosso disco entrasse no mercado. Tinha gente que comprava só por causa do &#8220;Linha&#8221;.</div> <div></div> <div><strong>Qual era a ideia de sair do Brasil?</strong></div> <div></div> <div>Tocar lá fora. &#8220;Já que ninguém quer ouvir as nossas coisas aqui…&#8221;. Porque era difícil, né? Nós fizemos o disco, mas, pra coisa pegar, custou muito. Parecia até uma motocicleta que eu tinha, uma motoquinha, que não pegava nunca. [Risos] Tinha que empurrar, era a Gulivete. Fiquei magrinho! O Azymuth também deixou a gente magrinho, porque foi difícil esse pessoal pegar. Aquele negócio de brasileiro, brasileiro é muito doido.</div> <div></div> <div>O pessoal do rádio ajudou a gente. Mesmo a gente fazendo música instrumental, eles entraram na nossa. O <strong>Boni</strong> [executivo da TV Globo] entrou na nossa, por exemplo. Depois acabamos brigando com ele, porque ele queria que a gente fizesse um desfile de moda, e a gente: &#8220;Ah, que desfile de moda, pô? Que que há?&#8221;. Já tínhamos feito vários <em>Rock Concert</em> na Globo.</div> <div></div> <div>Eles não sabiam que música era a nossa, então diziam que era rock. E a gente aceitava né? O que a gente podia fazer? Quando a gente não sabia o que era, falava: &#8220;Melhor a gente dizer que é &#8216;música contemporânea&#8217;&#8221; (risos). A gente dizia que era música contemporânea, mas ninguém entendia nada!</div> <div></div> <div><strong>Pouco depois do disco, em 1977, vocês foram os primeiros brasileiros a tocar no Festival de Montreux. Com isso aconteceu?</strong></div> <div></div> <div>A gente gravava muito na Polygram, aí fizemos um compacto com quatro músicas. Porque a gente vivia na Polygram, gravava lá dia e noite. E o diretor, <strong>André Midani</strong>, depois do compacto, ele saiu da Polygram e levou a gente embora [pra gravadora Warner]. Aí fomos pra Montreux, e ele foi junto. O <strong>Claude Nobs</strong>, o diretor de Montreux, viu a gente na Polygram ensaiando. A gente era dono daquele troço, vivia lá. E ele era um amigo do Midani, lá de Paris, eles eram franceses de família argelina. Aí ele ouviu e falou: &#8220;Ih, esses caras têm que ir&#8221;. Aí não teve jeito, enveredamos pro mundo. Pagamos R$4 mil cada um pra sair do Brasil. Os militares cobravam! Os caras eram uns canalhas. A gente tinha que pagar 4 mil dólares pra sair, e a gente precisava sair pra representar o Brasil lá fora. Foi 4 mil dólares cada um. Nunca mais deram esse dinheiro de volta.</div> <div></div> <div><strong>O festival foi a porta de entrada do Azymuth pro mercado global?</strong></div> <div></div> <div>Foi. Daí foi direto, começamos a conhecer pessoas, vendemos o nosso trabalho pra uma gravadora americana&#8230; Aí foi embora. Eles pensavam que o Azymuth era estrageiro a princípio. &#8220;De que lugar da Califórnia é?&#8221;, aí com o tempo eles foram aprendendo. Nós lançamos pela [gravadora] Fantasy, que é em Berkeley. A irradiadora principal do Azymuth foi a KBLX, uma rádio que tinha muita coisa muito boa.</div> <div></div> <div> <div><strong>E pouco depois, em 1979, o Azymuth teve um sucesso global com a música &#8220;Jazz Carnival&#8221;.</strong></div> <div></div> <div>Aí com o &#8220;Jazz Carnival&#8221;, na Europa, já sabiam que éramos brasileiros, por causa do grande sucesso. Nós fizemos a música pra dançar mesmo, e foi o nosso cartão de visitas para o público estrangeiro. Nossa, isso tocou em todo lugar do mundo. Tocou até na Cortina de Ferro, tenho muito orgulho de falar isso. Na Cortina de Ferro foi demais.</div> <div></div> <div><strong>Mas vocês não chegaram a se mudar para o exterior?</strong></div> <div></div> <div>Moramos temporadas. Lá em Berkley, pra gravar, depois começamos a fazer shows. Eles mesmos começaram com isso, o pessoal da Fantasy. O produtor que levou a gente também era muito importante, <strong>Orrin Keepnews</strong>, ele descobriu grandes nomes da música. Foi ótimo.</div> </div> </p>

"O Azymuth deu uma cor à música brasileira"

<div><strong>Eu queria voltar no estilo de vocês, porque o Azymuth é mais do que um grupo, vocês criaram um estilo.</strong></div> <div></div> <div>A gente não tinha noção de que era um estilo nosso. A princípio a vontade era fazer o que a gente tinha em mente, com o tempo é que a gente foi notando que existia uma coisa a mais. O Zé falava isto: &#8220;Temos que achar o nosso filão&#8221;. Com o tempo, fomos notando que o nosso filão estava ali, e começamos a trabalhar em cima disso. Inclusive encontramos um nome,  já na falta de um, o Zé falou: &#8220;Isso é samba doido&#8221;. Porque era samba, né? Tinha a ver com samba também, por que não chamar de samba doido? Então virou esse. Tem até um disco nosso que se chama <em>Crazy Rhythm </em>(1988).</div> <div></div> <div><strong>Como era tocar com o Mamão e o Zé?</strong></div> <div></div> <div>Tocar com o Bertrami e o Mamão era muito fácil, era tudo que eu queria. Eu nunca pensei que fosse chegar a tocar com pessoas com um quilate tão alto. Eu não tinha essa pretensão, não. Eu já tinha tocado com pessoas maravilhosas, conheci muita gente, mas que eu não tive a oportunidade de fazer essa amálgama. E com eles dois foi isso, fizemos um negócio juntos. Aí era correr pra galera, pra torcida.</div> <div></div> <div>Nunca pensei na minha vida que eu fosse ficar sem os dois. Agora eu tô aí. Mas fizemos tudo bem feito desde então, musicalmente a coisa tá funcionando. E estamos dando um jeito nas coisas futuras, não dá pra parar né. A gravadora, a Far Out, quer que a gente faça um novo disco. É o Azymuth, mas um novo time.</div> <div></div> <div><strong>E na verdade já tinha tido outras formações do Azymuth ali no início dos anos 1990.</strong></div> <div></div> <div>Já. Foi, voltou, uma época eu saí também. O projeto vai.</div> <div></div> <div><strong>Alex, e qual você acha que é a grande contribuição do grupo para a música do Brasl?</strong></div> <div></div> <div>Acho que o que a gente fez pela música brasileira foi abrir uma porta que estava fechada para as coisas do Brasil. Porque nós fizemos sucesso, &#8220;Jazz Carnival&#8221; ficou na parada de sucesso, em Londres, na Melody Maker, no hit parade americano, por semanas, bateu recorde. Uma das mais tocadas foi Azymuth. Qualquer garoto daquela época conhece, do mundo inteiro.</div> <div></div> <div>O Azymuth deu uma cor à música brasileira. O instrumental do Azymuth leva pro mundo uma bandeira legal. Deu um colorido muito grande. O pessoal gostava da bossa nova, mas já estava cansando, porque era tudo muito parecido. E com nós, começaram a ver que o Brasil tinha uma música com muito conteúdo, que nós tocávamos funk, samba — e tocávamos um &#8220;samba doido&#8221;, mais rápido do que em bossa nova. E eu acho que é um colorido muito grande que a gente dá à música brasileira de vanguarda. A gente tem uma contribuição muito forte. Eu espero que as pessoas possam compreender isso.</div> <div></div> <div><strong>Com certeza, tem pessoas no mundo inteiro que pensam isso.</strong></div> <div></div> <div>Agora mesmo, meu objetivo é a China. Nós já chegamos até a Coréia, estamos quase lá. Já ligaram pra gente, só não conseguimos um bom empresário lá em Taiwan. Não conseguiram levar a gente ainda, mas vamos chegar. Já chegamos em todos os lugares, graças a Deus.</div> <div></div> <div><strong>Você sabe em quantos países o Azymuth já tocou?</strong></div> <div></div> <div>Não sei, não tenho ideia. Todos os continentes. Ásia, Europa, Oceania, África. Outro dia tocamos em Casablanca, uma gracinha. Um pessoal maravilhoso, o Marrocos é uma graça.</div> </p>

Por: Ariel Fagundes

Ariel Fagundes

Fotos: Acervo Azymuth

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